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PONTE DOS ESPIÕES (Bridge of Spies)


por Tiago Lira

Uma das magias da arte do cinema é ser universal, ainda que certos personagens e histórias não falem exatamente sobre nós. Quase sessenta anos nos separam dos eventos Ponte dos Espiões e da Guerra Fria. Milhares de quilômetros entre o nosso país e os envolvidos naquele conflito. Ainda assim, podemos achar paralelos e perceber que a história tende a se repetir. Vivemos num mundo de extremos, onde parece que se você não está do nosso lado é automaticamente tachado de uma dezena de termos depreciativos. Essas posições polarizadas deixam pouco espaço para o diálogo, criando uma cortina de ódio perigosa e talvez sem volta. Olhar o outro lado e perceber que estamos lidando com pessoas é a maior mensagem do novo filme de Steven Spielberg, um dos maiores fãs da humanidade.

O diretor não perde tempo com rodeios e nos primeiros minutos de projeção sabemos sem sombra de dúvida que Rudolf Abel (Mark Rylance) é um espião. Essa decisão coloca a audiência, pelo menos nos primeiros momentos, numa luta de nervos contra a decisão do advogado James Donovan (Tom Hanks) de não só defende-lo, mas de ir às últimas consequências por uma convicção. Nada disso é simplesmente jogado na tela por Spielberg e pelo trio de roteiristas, mas é traçado em poucos momentos. Na primeira cena vemos Abel pintando um autorretrato mostrando não só sua veia artística, mas como um homem que está conhecendo a si mesmo. James é apresentado como alguém firme e seguro de si, observador e engraçado – tudo isso em menos de cinco minutos com poucas e precisas linhas de diálogo.

Percebemos que Jim também sabe da origem de Abel e que luta com sua fibra contra o senso comum de culpa-lo sem um julgamento justo. Ele próprio vivendo numa sociedade polarizada hesita por um curto momento em aceitar o caso, mas a batalha interna não é nada comparada com a externa. Jim, um homem que serve a lei, tem que ouvir de outras esferas da sociedade que ele estaria fazendo alguma coisa errada: um juiz, um policial e a própria família está repetindo uma propaganda sobre o medo de um ataque nuclear vindo dos seus inimigos. O que é uma crítica monstruosa de como o Estado pode segurar seu povo dentro de uma bolha de perigo constante.

Spielberg coloca diversos paralelos na história e os aplica na narrativa tanto por meio da montagem de Michael Kahn e raccords para ligar e contrapor certos momentos. No primeiro julgamento o diretor mostra Jim e Abel (e toda a corte) se levantando à presença do juiz do caso, enquanto algumas crianças na escola do filho do advogado fazem o mesmo movimento para saudar a bandeira americana. Em outra situação, Jim é mostrado entrando na Suprema Corte enquanto no outro campo de batalha Powers (Austin Stowell) embarca na sua aeronave de reconhecimento. Por meio desse elemento fílmico, Spielberg faz a junção de dois momentos que são ideologicamente estejam separados, mas que tratam da mesma coisa: uma crença.

Esse é um filme bem direto e, como já é a assinatura de Spielberg, muito humano. Assim como fez com Oscar Schindler o diretor ousa, por assim dizer, defender outro inimigo jurado dos EUA. O comunista e espião tem medos e receios, se preocupa com seu advogado verdadeiramente e é mostrado frágil – porém, não idiota. Quando o FBI invade o apartamento onde Abel está trabalhando, em meio à certa truculência, o russo está praticamente sem roupas decentes e sem os dentes. É nessa fragilidade que Spielberg continua mostrando o destino de Abel e no que Jim se segura para fazer a coisa certa. E esses três personagens – Jim, Abel e Powers – não são tão diferentes um do outro. Eles se mantêm naquilo que acreditam.

É um ponto de vista diferente. Filmes do período da Guerra Fria tem sido raros – apesar de O Agente da U.N.C.L.E também ser de 2015 – então vale a pena experimentar o que Spielberg nos trouxe. Nos perdemos junto com Jim na Alemanha Oriental, ao ponto de o estúdio não legendar as falas em alemão. Apesar da língua ser a 10ª mais falada no mundo, quantas pessoas você conhece que são fluentes nela? Assim, temos que nos orientar com a pouca experiência da língua que o advogado tem. Aliás, a mudança de foco aparece também em fatos poucos vistos por nós como o desejo de reconhecimento da República Democrática Alemã – RDA – ou a construção do muro de Berlim, já que o mais comum é o vermos já levantado.

A produção consegue em certos momentos ter uma leveza, mesmo que não durem muito. Os minutos iniciais com Jim aprontando para que o assistente não leve sua filha para sair, a perplexidade na diferente Berlim Oriental com bicicletas nos corredores ou a constante preocupação com a falta de preocupação de Abel são momentos que trarão sorrisos ao rosto da plateia. Em oposição é um filme bem sério no campo político. A fotografia de Janusz Kaminski usa cores frias tanto nos encontros de Jim com Abel quanto na congelante Berlim. Há outras cenas marcantes que valem a pena serem lembradas, em especial a do tiroteio que Jim presencia nos limites do muro e depois a tensão representada pela figura de duas duplas de atiradores de elite.

Ponte dos Espiões funciona tanto como retrato de uma época quanto a representação de que se algo é justo e certo para um, deve ser assim para todos. Há momentos de emoção e revolta, outros que deixam no ar a pergunta de como duas nações tão poderosas influenciaram negativamente o mundo, mostrando como o medo é uma arma eficaz. Longe de ser um filme de guerra nos moldes clássicos, tão pouco um de júri, é uma produção que veio em boa hora, considerando essas discussões acaloradas que hoje vemos. Pode servir para aprendermos a nos entender e discutir ao invés de agredir.


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EU ESTAVA JUSTAMENTE PENSANDO EM VOCÊ (Comet)


por Beto Besant

"Em briga de marido e mulher, não se mete acolher". Como sugere o velho dito popular, histórias de casal não são interessantes e deve-se manter distância.
O filme Eu estava justamente pensando em você trata-se justamente de uma DR (discussão de relacionamento) de quase duas horas de duração.

Para nossa sorte, aqui temos uma agradável experiência, onde uma história simples  - que é o período de início ao fim de um namoro - é o que conduz a narrativa de forma leve e inteligente.



O filme do estreante Sam Esmail tem praticamente só dois personagens - os outros aparecem rapidamente e sem nenhuma grande relevância - e conta a história de Dell (Justin Long), que vai a um evento onde as pessoas irão assistir a passagem de um cometa. Quase é atropelado por um carro e é Kimberly (Emmy Rossum) quem o salva. A tensão sexual entre ambos surge instantaneamente, mas ela está com seu namorado, um bonitão que não tem "muito o que dizer". Daí em diante passamos a acompanhar o relacionamento do casal ao longo de três anos. A partir daí, o filme apresenta paralelamente quatro momentos importantes do casal: o dia em que se conheceram, uma discussão por telefone, uma viagem a Paris e um encontro casual no trem.


O que tinha tudo pra ser um filme chato e arrastado, resulta num filme interessante graças aos diálogos inteligentes, à montagem ágil e fora de ordem cronológica, e à fotografia esmerada e cuidadosa, que subverte regras fotográficas, colocando os personagens no canto do quadro, na maior parte do tempo, dando a sensação de desequilíbrio, sufoco e instabilidade.

A sensação de desequilíbrio é tanta que os atores - que tem características físicas que em muito lembram filmes latino-americanos - causam estranhamento por viverem Estados Unidos e falarem inglês. Algo como se fosse um filme argentino dublado em inglês.

Não é um filme extremamente palatável, mas vai agradar aos que preferem filmes mais cerebrais e de casais. Tem grande chance de se tornar cultuado pelos casais como aconteceu com Closer (Mike Nichols, 2004).



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Entrevista: OPERAÇÕES ESPECIAIS

Beto Besant entrevista os atores Cleo Pires, Thiago Martins, Fabrício Boliveira e o diretor Tomás Portella - do filme Operações Especiais.


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Coletiva: OPERAÇÕES ESPECIAIS

Veja como foi a Coletiva de Imprensa do filme Operações Especiais, acontecida dia 5/10 em São Paulo.
Presença do diretor Tomás Portella e dos atores Cleo Pires, Thiago Martins, Fabrício Boliveira e Antonio Tabet.



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HORAS DE DESESPERO (No Scape)


por Tiago Lira

Há uma mistura de sentimentos depois de assistirmos Horas de Desespero, uma sensação que está ao alcance de um braço, mas ainda fica difícil de notar. Ainda que seja uma produção embalada nos mesmos moldes dos filmes de ação, o diretor John Erick Dowdle consegue afastar seus personagens de gente como Bryan Mills ou Frank Martin e ainda é seguro o suficiente na direção para criar uma trama tensa. Por outro lado, a problemática desenvoltura dos inimigos como se fosse uma horda de zumbis é o ponto mais fraco do filme. Um pouco mais de tato nessa questão destacaria mais a produção que, infelizmente, resolver tomar o caminho mais fácil.

Uma das qualidades do filme é perceber os ecos estão acontecendo em algumas partes do oriente. Sinais de uma ditadura – fotos e bustos do primeiro ministro em todos os lugares, cidade às escuras à noite lembrando Pyongyang, sem sinal de TV, telefone ou internet – e situações parecidas com o Isis e o Boko Haram dão atualidade à história. Tanto quanto a intervenção americana e inglesa representada Jack (Owen Wilson) e Hammond (Pierce Brosnan). E no meio da guerra desse Camboja (ou um Laos) fictício, nos apegamos à família de Jack principalmente por causa da doçura das filhas dele e de Annie (Lake Bell).

É claro o contraste exagerado das tropas orientais, onde um comandante sem nome e extremamente mal lidera um mar de pessoas desumanizadas que caçam os estrangeiros no seu país. Não é que isso seja mentira – as notícias que chegam para nós mostram tais barbáries –, mas seria tarefa do diretor mostrar um pouco mais de empatia para com a família de Jack. Para minimizar a situação, Dowdle mostra um encontro da família Dwyer com duas boas almas: um jovem que está no meio da horda e depois um senhor idoso que os esconde. O interessante na cena em que os quatro estão fugindo e cruzam com esse jovem é o fato dele não estar mascarado como seus companheiros, que estão representando um sistema ou algum regime.

Fazendo o papel de advogado do diabo, o filme leva a outra possibilidade se nos colocarmos na pele de Jack, pego no meio do fogo cruzado. Vejam a emblemática cena em que ele se encontra no meio do conflito dos revoltosos e da força policial, por exemplo. Aquela é a percepção do protagonista: perdido num conflito que ele desconhece – se bem que é difícil acreditar que não sabia que o país estava à beira de um conflito armado –, num lugar que não fala a língua e ainda com a família em perigo é bem aceitável que ele veja os cidadãos como inimigos. Assim como os orientais sobre os estrangeiros em sua terra. Pensando assim, não é tão difícil entender o posicionamento tanto um como o do outro.

Ainda que o filme seja acusado de ser racista e xenofóbico, é inegável que Dowdle sabe dirigir os quase 100 minutos de filme equilibrando momentos de ação e de extrema tensão. A não ser por uma pequena inserção cômica de Kenny Roger (Boonthanakit) a produção não perde o pique, efeito auxiliado pela montagem que coloca os problemas logo no começo. Depois de voltar na narrativa, sabemos que falta pouco para descobrir qual é o resultado de um assassinato. A cena de Jack subindo pelo elevador para encontrar a família parece infinitamente mais longo do que realmente é por não sabermos qual é a situação real. Além disso, o diretor sabe quando usar o silêncio, emudecendo tanto a trilha quanto os sons ambientes numa agoniante cena envolvendo as duas filhas pequenas do casal.

Dowdle é competente também em contar a história visualmente sem apelar para narrações ouflashbacks. Ele mostra rapidamente as marcas no rosto de Hammond, ali já definindo sua personalidade e dando uma dica de suas intenções. No figurino é interessante notar que Jack passa pelos piores momentos da sua vida usando por baixo da camisa social uma camiseta da sua cidade natal (Austin, Texas) que representa a saudade que ele tem de casa. A câmera na mão e os ângulos holandeses completam o estado de tensão que o diretor quis transmitir para a audiência, e nisso obtém sucesso.

A ironia do final e a boa jogada de não usar o clássico herói de ação são outros pontos positivos de Horas de Desespero. As qualidades da história não devem ser postas de lado quando analisamos os problemas já apresentados, principalmente na caracterização de um povo, mesmo que esse país não tenha um nome para que ninguém aponte dedos. Mas, como thriller, é eficaz. E se essa foi a intenção do diretor, de nos deixar respirar só quando um personagem diz que podemos, a missão foi cumprida. O que não quer dizer que devemos desviar os olhos para as outras questões.


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Coletiva: VAI QUE COLA


por Beto Besant

Aconteceu na última segunda-feira na capital paulista a Coletiva de Imprensa do filme Vai que Cola. Estavam presentes os atores Fernando Caruso, Cacau Protásio, Samantha Schmutz, Catarina Abdalla, Fiorella Matheis, Emiliano D'Ávila e o diretor César Rodrigues.

Baseado na serie de TV paga, o filme conta a história do empresário Valdomiro (Paulo Gustavo), que tem uma boa vida no Leblon mas perde tudo num esquema fraudulento em que é colocado por seu sócio (Márcio Kieling). Dessa forma vai morar na pensão da Dona Jô (Catarina Abdalla) no bairro periférico do Méier. 
Os outros moradores são os caricatos Ferdinando (Marcus Majella) - homossexual que se intitula consierge da pensão, Jéssica (Samantha Schmutz) - "periguete" que sonha namorar alguém famoso e assim se tornar uma "celebridade", Velna (Fiorella Matheis) - a loira fatal, Maicou (Emiliano D'Ávila) - o musculoso burro e Teresinha (Cacau Protásio) - a gorda divertida.

César Rodrigues e Catarina Abdalla
Após a pensão ser interditada, todos vão morar com o protagonista no bairro do Leblon. Lá conhecem o síndico Brito (Oscar Magrini) e o morador Quaresma (Werner Schünemann).

Completam o elenco o humorista Fernando Caruso - no papel de um eletricista apaixonado pela dona da pensão - e Klebber Toledo - no papel dele mesmo.

De forma talvez um pouco forçada, os atores procuraram demonstrar o tempo todo o quanto estavam entrosados e tinham liberdade de provocar uns aos outros, principalmente Caruso e Samantha.

Samantha Schmutz e Fiorella Matheis
O diretor conta que estava muito feliz em levar a série para as telonas e sobre o limite entre brincarem e improvisarem à vontade: "Apesar de  serem todos muito talentosos e criativos, as brincadeiras eram sempre equilibradas. Tínhamos cinco semanas de filmagem então diariamente todos sabiam exatamente o que teriam que fazer" - disse César Rodrigues.

Num plano-sequência (cena sem corte) onde Paulo Gustavo e Majella conversam na praia, o diretor conta que parecia "certinha demais". Com isso, o protagonista pediu pra rodar de novo, e sem avisar ninguém passou uma rasteira em seu colega. César usou esse exemplo pra explicar o quanto o ator é talentoso e criativo na improvisação. 

Fernando Caruso, Cacau Protásio e Emiliano D'Ávila

A série do Canal Multishow é um imenso sucesso, e apesar do filme ter tudo pra ser outro enorme sucesso nas bilheterias, se perde no seu estilo televisivo. Tudo é falado demais, durante os 90 minutos Paulo Gustavo conversa com o público - olhando pra câmera - explicando cada pensamento e cada situação. Em nome de uma pseudo-espontaneidade, o filme fica mais com cara daqueles vídeos de internet que pipocam diariamente.

Um dos melhores momentos é quando a trupe faz a mudança para o Leblon e Majella vai sentado sobre a Kombi, numa sátira ao filme Priscila, a Rainha do Deserto (1994). 

Apesar do trailer divertidíssimo, o filme não corresponde à expectativa, se limitando a personagens estereotipados, piadas forçadas e humor histriônico.


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UM SENHOR ESTAGIÁRIO (The Intern)


por Tiago Lira

Há um conceito errado e até bem difundido sobre desligar o cérebro pra assistir certos filmes – tema discutido na edição 24 do nosso podcast –, uma falácia que não deve ser aplicada nem mesmo em filmes leves e simpáticos como é o caso de Um Senhor Estagiário. É uma produção que não ofende ninguém e é feito para qualquer pessoa, como podemos ver pela fotografia bem iluminada e na razão de aspecto 16:9, o widescreen dos modelos de TV atuais. De vez em quando é bom se deixar levar sem precisar pensar em conflitos, o que é bem diferente de desligar alguma parte sua que não se pode. Mas não dispense essa comédia pois, no fundo, ela tem um quê de representatividade.

A diretora e roteirista Nancy Meyers faz uma brincadeira com o título que vale a pena destacar. Apesar de remeter Ben Whittaker (Robert De Niro), toda a história vai avançando naturalmente para mostrar a verdadeira protagonista. Ainda que a justificada narração off inicial dê destaque ao septuagenário, você vai notar que toda a narrativa é em torno da atarefada Jules Ostin (Anne Hathaway) – personagem que parece uma evolução de Andy Sachs (de O Diabo Veste Prada, 2006). Os problemas que ela enfrenta serão acompanhados de perto por Ben, que representa a audiência dentro do filme. Com exceção de uma narração off de Jules, que poderia ser traduzida simplesmente pelo olhar que ela dá para uma bagunçada mesa, sabemos o que o estagiário sabe, o que em determinado ponto chega a ser agoniante por um segredo que ele guarda.

Meyers consegue construir personagens ótimos, carismáticos e tridimensionais e quais podemos gostar, desde a dupla principal até os coadjuvantes. Ben é uma pessoa extremamente adorável, talvez aquele que a maioria de nós nunca será: observador, natural, se desataca – por motivos que vão além de sua idade – e é bom com todos, inclusive com quem não mereceria (como o motorista de Jules) e se torna impossível não gostar dele. Os outros personagens são automaticamente atraídos para ele de forma natural. Isso parece refletir a própria personalidade do ator, que podemos confirmar na relação paternal de Ben com Jules – representada pela mãe dela que só ouvimos a voz e do filho dele que nunca vimos a cara.

Em determinado ponto você tende a se perguntar de onde virá o conflito, pois estamos tão acostumados ao clichê de ter que acontecer alguma coisa entre esses dois, que esperamos isso a cada minuto de projeção. Interessante que Meyers não explora esse clichê e a rusga entre os dois se resolve tão rápido que nem vale a pena se remoer por isso. O que reforça a escolha não tão clara de Jules como a protagonista, pois os conflitos são inteiramente dela: as conversas com a mãe, a situação com o marido, o julgamento de outras mães e o fato dela liderar uma companhia de sucesso. Então, entre ela e Ben não existe essa necessidade.

Isso não quer dizer que o filme escape de outros clichês. Ben parece ser o tio mais legal do mundo, portanto fica óbvio desde os primeiros minutos é que ele quem vai resolver o problema de moradia de Davis (Zack Pearlman), um jovem estagiário. Ou ainda que vá existir uma relação com a massagista da empresa, Fiona (Rene Russo), sendo eles os mais seniores da equipe. Para dosar essa sensação há momentos que são feitos para todo mundo sair com o maxilar doendo de tanto rir. Duas cenas de massagem protagonizadas por Fiona e Ben – piadas sexuais, mas contidas – e o roubo que é protagonizado pelos estagiários são exemplos de como essa produção é despojada sem ser forçada.

Há filmes mais marcantes sobre o envelhecer e sobre como se destacar num mundo onde você era o dominado e não o dominador, que é o papel tanto de Jules quanto de Ben – ela numa posição majoritariamente masculina, no qual acha que buscar a solução para tirar o peso dos ombros ajudará no casamento e no papel clássico de mulher/esposa/mãe; e ele buscando um lugar num mundo de jovens – mas Um Senhor Estagiário é tão cheio de bons momentos, sejam eles simbólicos ou visuais, que é fácil dizer que saímos da sessão conquistados, leves, edificados e nos sentindo para cima. Algo que precisamos de vez em quando.


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A PELE DE VÊNUS (Venus in Furs)


por Beto Besant

Uma das maiores dificuldades que um roteirista pode enfrentar é ter que escrever um filme que se passe apenas em uma locação. Normalmente, quando surge algum filme do tipo é adaptado de uma peça teatral, e mesmo assim quase sempre se procura inserir novas locações com o intuito de dar ritmo ao filme.
Aqui, o experiente Roman Polanski tenta novamente adaptar uma peça teatral - seu filme anterior Deus da Carnificina também foi uma adaptação - porém este novo trabalho atinge um resultado bem mais satisfatório, apenas com uma locação e dois atores.


Na trama, Thomas (Mathieu Amalric) é um diretor de teatro fazendo seleção para a atriz de sua nova peça. O surgimento de Vanda (Emmanuelle Seigner) e seu insistente pedido para que possa ser avaliada em princípio irrita o artista, que terminar por ceder. A mulher - que aparenta ser o oposto de quem procura - o surpreende, deixando-o cada vez mais fascinado por sua personalidade voluptuosa. Aos poucos, a realidade dos personagens e texto teatral que interpretam vão se misturando, proporcionando alternância de poder e até mesmo de gênero entre Vanda e Thomas.

Pele de Vênus é uma adaptação da peça A Vênus das Peles de David Ives - que também divide o roteiro com Polanski - e por sua vez é baseado no romance de Leopoldo von Sacher-Masoch, de onde surgiu a palavra masoquismo.

O diretor embarca numa história com fortes elementos autobiográficos, desde sua famosa acusação de abuso de menor até o fato de escalar sua mulher para o papel da atriz e Mathieu - que é idêntico a Polanski na juventude - para interpretar o diretor.
Ainda há a "brincadeira" de iniciar o filme com a câmera entrando no teatro e terminar com ela saindo, como se o próprio público entrasse e saísse da história.

Contrariando o cinema, é um filme extremamente verborrágico, porém tudo feito com muito cuidado e diálogos inteligentes e precisos. Como não poderia deixar de ser, um filme com uma locação e dois atores acaba por ter um ritmo mais lento para quem está habituado ao cinema comercial, porém a montagem de Hervé de Luze e Margot Meynier - somada às excelentes interpretações, direção e diálogos, fazem com que o filme flua com tranquilidade.


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NOCAUTE (Knockout)


por Tiago Lira

A vida, essa coisa injusta, está aqui para dar pancada na gente. E filmes de superação não faltam para nos lembrar disso. Nocaute tem muito bons momentos, ótimas atuações e um Antoine Fuqua mostrando que sabe como se portar como diretor. O clichê do tema, tanto visitado em outros filmes, é bem claro e pode ser algum tipo de empecilho para conhecer a obra. Então, não é original, mas pelo menos é empolgante. Com uma virada inesperada e muito melancólica, o filme consegue dar seus próprios passos, ainda que de vez em quando nos lembremos de outro canhoto que também fez sucesso lutando boxe nos anos 1970.

Há uma sensação constante de tristeza na produção. Billy (Jake Gyllenhaal – quase irreconhecível) é um ótimo lutador, mas a quantidade de socos que leva no ringue, ainda que iluminado pelas luzes do holofote, trazem um olhar de pesar para Maureen (Rachel McAdams). A esposa está sempre presente na plateia e, por não poder fazer nada além de olhar, encarna um semblante triste que só vai embora quando está na tranquilidade de casa junto dele e da filha Leila (Oona Laurence). Essa melancolia é reforçada tanto pela paleta do cinematografo Mauro Fiore – usando muito da meia luz – quanto pelo figurino de Billy, predominantemente preto por praticamente dois atos.

Billy é um personagem muito interessante, e a narrativa consegue apresentar suas características no melhor jeito mostre e não fale: a sua concentração, sempre olhando para os punhos, se isolando com música, seu jeito jocoso de ser com os adversários, suas tatuagens (nascimento da filha, nomes, pai, lutador) e uma das coisas mais marcantes, que mistura um problema fisiológico com um psicológico, que é quando Billy começa a cuspir sangue depois da luta da abertura, mesmo depois de horas do fato. Literalmente, ele pode ter algum tipo de hemorragia não controlada, mas não podemos ignorar uma leitura subjetiva, a impressão de que algo está muito errado por dentro do boxeador.

A virada do primeiro para o segundo ato é um soco no estômago da audiência e, obviamente, para o próprio Billy. Ouvindo as pessoas erradas, como o agente Jordan (Cent Jackson) e afogado nesse mar de tristeza – perceba que Fuqua coloca o lutador constantemente isolado, seja no ginásio, em casa ou no pequeno apartamento para o qual ele tem que se mudar –, Billy parece encarnar o próprio Ceifador, como podemos notar nas cenas em que ele usa um capuz para esconder o rosto e os próprios propósitos de vingança. E é na câmera subjetiva, bem usada pelo diretor, que sentimos a perda de foco do protagonista.

A mudança do personagem finalmente vem e é seguida de perto pelo novo treinador Tick (Forest Whitaker), um homem experiente e tão amargurado quanto Billy, com seu visual mais bagunçado, triste e acabado. Como tantos outros mentores, ele não deve ser julgado pelo tamanho ou aparência. Billy, que perdeu a guarda da filha, busca redenção e Fuqua vai aos poucos mudando a personalidade do personagem no mesmo estilo que o apresentou no começo. Agora, Billy usa menos figurionos pretos, passando por cinza e eventualmente usando luvas brancas na luta final. Também há uma mudança de atitude no estilo de luta, agora cortes de câmera mais longos e menos sangue pingando na tela.


Outros elementos interessantes que completam a psique dos personagens são o olho constantemente inchado de Billy – que faz um paralelo com o cego que Tick tem –, a Bíblia que o treinador sempre segura, e a postura de Jordan tão detestável, porém crível, e a lucidez e o brilho que Maureen trazia são bem definidos por Fuqua. O slow motion nas percepções de Hope ou as duras palavras que a filha usa com ele também são marcantes. O problema reside na construção do oponente Miguel (Miguel Gomez), exageradamente cretino sem necessidade, principalmente no embate final contra Billy.

Conseguindo misturar tensão e momentos muito doces, sendo ótimos exemplos os que precedem a luta final e logo depois dela – de um lado a tensão do vestiário, e do outro quando a câmera, que é o espectador, se afasta de Billy e Leila – mostram que Fuqua é um bom diretor. Nocaute tem situações que já vimos em outros lugares e mesmo assim está longe de ser esquecível. As comparações serão inevitáveis, e a estrutura do roteiro em si vai contribuir para isso. Ainda assim, você poderá apreciar o filme, seja tratando-o como uma homenagem a Rocky ou se deixando levar pela mensagem de superação.


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LOVE (idem)



por Beto Besant

Love, novo trabalho do cineasta argentino Gaspar Noe, causou espanto desde que foi anunciado como: o primeiro "filme de arte" com cenas de sexo explícito em 3D.

Na trama, o jovem cineasta Murphy (Karl Glusman) passa a se recordar do romance vivido com Electra (Aomi Muyok), agora desaparecida. Um romance à base de drogas e muito sexo - incluindo duas mulheres e travesti - que "desaba" por conta de uma traição com Omi (Klara Kristin), uma bela vizinha convidada para um sexo a  três.

Contado de trás pra frente - como em seu famoso Irreversível (2002) - a história é basicamente uma "DR" (discussão de relação) de mais de duas horas temperada com cenas de sexo.

Gaspar Noe, um argentino com formação acadêmica na França - é um dos poucos cineastas que conseguem manter sua assinatura mesmo com sua notoriedade e prestígio. É o tipo de cineasta que se posiciona. Em seus filmes sempre aborda o lado obscuro do ser humano e estes sempre causam uma impressão: seja boa ou má - dependendo do "gosto do freguês" - o diretor nunca passa despercebido. É o estilo de cinema "ame ou odeie".

O protagonista é uma espécie de alter-ego do diretor, e em certo momento do filme diz que quer fazer filmes "que tenham lágrima, sangue e esperma", justificando que essa é a essência da vida. Isso reflete a filmografia do diretor, que sempre caminhou "no fio da navalha". Seja em seus primeiros filmes - com uma alta carga de sexualidade explícita - seja em Irreversível, filme que projetou seu nome internacionalmente.

Love possui um ritmo lento mas envolvente, fora de ordem cronológica. Em cada corte - e muitas vezes sem mudar de plano (o enquadramento da cena) há um rápido escurecimento de tela (conhecido como "black") - que dá a sensação de ser a piscada do espectador. Como se estivesse durante todo o tempo junto dos atores.  
O filme tem pouquíssimos movimentos de câmera e sua trilha oscila entre temas de rock pesado a música erudita, com cordas e sopros. Há também a famosa "Jazzopédie" - do compositor francês Erik Satie.


Apesar da polêmica causada no Festival de Cannes - o filme foi sonoramente vaiado - o que se vê não é nada tão explícito como vemos em outros filmes. Talvez o que tenha causado maior espanto foi o fato das cenas serem acompanhadas de uma história envolvente, bem interpretada - apesar da inexperiência das atrizes e pouca experiência do ator - e muito bem dirigida.

Foi curioso de se ver a quantidade de jornalistas e críticos presentes na sessão. Isso mostra que o consistente trabalho cinematográfico de Noe ainda vem despertando a curiosidade dos especialistas no assunto.



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Entrevista: PEQUENO DICIONÁRIO AMOROSO 2

Beto Besant entrevista a atriz Priscila Steinman e  ator Renato Góes - do filme Pequeno Dicionário Amoroso 2.


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Coletiva: ENTRANDO NUMA ROUBADA


por Beto Besant

Aconteceu na no último 31 de agosto - na capital paulista - a coletiva de imprensa do filme Entrando Numa Roubada.

O filme conta a história de Eric (Júlio Andrade) e Walter (Lúcio Mauro Filho), que decidem convidar seus amigos Vitor (Bruno Torres), Laura (Deborah Secco) e Letícia (Ana Carolina Machado) para fazerem um filme onde assaltarão postos de gasolina enquanto filmam, porém só os dois sabem da verdade. Para isso, inventam que seria um método polonês de interpretação.
O objetivo é chegarem até o pastor Alex (Marcos Veras), um antigo amigo que lhes roubou o lucro de um filme anterior e investiu em igrejas evangélicas. 



Estreando na direção de longa-metragem, André Moraes - que tem uma longa carreira como compositor de trilhas-sonoras - apresenta um filme com forte influência de Quentin Tarantino, que apesar de um pouco inverossímil, diverte sem ser alguma nova comédia genérica. Aliás, com relação à verossimilhança - motivo pelo qual o filme sofreu várias críticas - considero uma "licença poética", uma vez que se pensarmos friamente sobre os argumentos de grandes sucessos internacionais, veremos que também são bastante improváveis, mas por algum motivo que não cabe aqui desenvolver, não são tão severamente criticados.

O diretor conta que teve a ideia de fazer o filme mas concluiu que não poderia demorar para levantar seu custo, por isso optou por entrar em editais de baixo orçamento. "O filme foi desenvolvido com o título provisório A Estrada do Diabo - que lembrava filmes de terror. Sabíamos que seria mudado e passamos dois anos decidindo. Cogitamos rebatizá-lo de O Troco, mas acabamos chegando ao título definitivo em longas conversas com o produtor e o distribuidor" - conta André Moraes.

Ele também conta que originalmente o filme seria mais "leve" - apesar do humor negro - mas com a chegada de Júlio Andrade perceberam que deveriam seguir numa linha mais alternativa.

Júlio Andrade é o responsável pelas melhores interpretações do filme, pois conduz seu personagem com a carga dramática que costuma defender seus personagens. Não por acaso, é um dos melhores e mais requisitados atores do cinema brasileiro.

Com essa mudança, na sala de montagem decidiram cortar várias piadas que foram filmadas, para evitar que o foco do filme fosse desviado.

Perguntei à atriz Deborah Secco o que a fez aceitar um papel mais leve, diferente de seus personagens anteriores dos filmes Bruna Surfistinha e Boa Sorte. "Fui convidada pelo André quando ainda fazia o Bruna [Surfistinha] e achava que seria um contraponto ao personagem anterior, mas o Boa Sorte acabou saindo antes e deu a impressão de que só faço personagens densos" - conta a atriz.



O diretor também assina a trilha-sonora junto com Vivian Buff - que viveu cinco anos em Los Angeles e trabalhou em filmes como Capitão América e Big Hero. Ele conta que gostaria de gravar um conjunto de cordas, mas no Brasil estava difícil conseguir bons músicos disponíveis. Até que soube que em Los Angeles havia uma grande oferta de bons músicos do segmento, por isso optou por gravar por lá.

Com baixo orçamento - o filme custou 1.8 milhões de reais - Entrando Numa Roubada chega com forte lançamento: 200 salas. Uma boa surpresa para nosso cinema, ainda mais considerando ser o filme de estreia do diretor.


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DIÁRIO DE UMA CAMAREIRA (Journal de une Femme de Chambre)



por Antonio Carlos Egypto

Diário de Uma Camareira é um filme de Benoît Jacquot, com base em livro de Octave Mirbeau, publicado em 1900. É uma boa história, um tanto datada, mas sempre interessante de se ver. E o diretor é corajoso, a mesma trama já foi filmada por Jean-Renoir e Luís Buñuel. Na versão de Buñuel, de 1964, o papel principal coube simplesmente a Jeanne Moureau. Comparações complicadas de se fazer. Fica sempre a questão: precisava refazer o que já foi bem feito? 

Na versão atual, de 2015, o papel de Célestine, a camareira, coube a Léa Seydoux, que põe sua beleza e seu estilo blasé a serviço de um personagem ambíguo: de um lado, subserviente, demonstrando aceitar a condição de empregada doméstica que se permite deixar escravizar. De outro, com uma revolta latente e a busca pelo momento de virar o jogo. No filme, falas sussurradas (a la Collor, xingando Janot no Congresso Nacional, num dia desses) tentam explicitar esses sentimentos e essa ambiguidade. Não gostei do recurso, desnecessário. Isso tem de vir dos gestos, olhares, postura. E a atriz consegue transmitir isso bem.

A trama se concentra no trabalho de Célestine, que vem de Paris para a família Lanlaire, na região de Provence. A camareira, além de bonita e vistosa, se veste muito bem com as roupas da época (fim do século XIX, início do XX). 

Maltratada pela patroa, assediada pelo patrão, tentando se entender com os outros empregados da casa, ela vai sondando o ambiente, em busca de alcançar seus objetivos. Encontrará em Joseph (Vincent Lindon), o jardineiro e faz-tudo, empregado de absoluta confiança da casa, um parceiro potencial. O problema é que ele manifesta um antissemitismo radical: tudo o que há de mal é atribuído aos judeus, a origem do que virá algumas décadas depois a produzir o Holocausto. Célestine não vê diferença entre as patroas judias e as demais, mas nem por isso desiste dessa parceria.


O enredo vai tomando rumos que surpreendem e conseguem envolver o espectador. Em que pese o diversionismo da direção, que, abruptamente, intercala cenas de flash back que, na verdade, não precisariam existir. As experiências passadas da camareira, apesar de fortes, não alavancam a narrativa, na verdade a dispersam. Caberiam em poucos diálogos, alguns até já estão no filme. E outros poderiam ser acrescidos. Bastaria isso.

A questão da confiança na relação patrão-empregados e os conflitos de classe inevitáveis estão bem expostos no filme, o elenco é de primeira, trata-se de uma boa produção, mas não basta, faltam brilho e inventividade. A nova versão de Diário de Uma Camareira é apenas mediana.


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Coletiva: A ESPERANÇA É A ÚLTIMA QUE MORRE


por Beto Besant


No último dia 26 de agosto, aconteceu num hotel de Sâo Paulo a Coletiva de Imprensa do filme A Esperança é a última que Morre.
Estavam presentes: Eduardo Albuquerque (roteirista), Calvito Leal (diretor), e os atores Rodrigo Sant'nna, Dani Calabresa, Katiuscia Canoro, Augusto Madeira, Thelmo Fernandes e Márvio Lúcio - conhecido no programa Pânico na Band como "carioca".

No filme, Hortência (Calabresa) é uma repórter de nome Hortência que busca tornar-se a nova "ancora" do jornal local, cargo também disputado pela rival Vanessa (Katiuscia). Para isso, inventa um assassino em série na cidade, tida como a mais segura do país. Para executar tal plano, pega corpos no IML - através de seus amigos Eric (Danton Mello) e Ramon (Rodrigo Sant'anna) e coloca na "cena do crime" sempre deixando um dito popular, batizando o suposto assassino de Assassino dos Provérbios.

Por mais que pareça algo inverossímil, quando o filme consegue construir seu universo de forma sólida, isso é facilmente relevado. Aqui o problema é que - apesar do elenco talentoso e estelar - o filme não consegue sua principal proposta: fazer rir.

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Apesar disso, o roteiro tem o mérito de construir um arco dramático (a evolução dos personagens), algo que muitos filmes do gênero não tem, mas peca por não extrair do elenco o seu melhor. Talvez seja por falta de experiência do diretor, que estreia em ficção após o belo documentário Simonal: ninguém sabe o duro que dei.

Calabresa mantém o tom caricatural que a colocaram no programa Zorra dificultando a identificação do público, e quando precisa ir rapidamente do humor ao drama não consegue fazer a passagem. Katiuscia está melhor - apesar de caricata - fazendo a típica apresentadora, daquelas que falam com dicção perfeita 24h por dia. Rodrigo é o responsável pelos melhores momentos do filme, numa atuação bastante diferente das que o consagraram no já citado programa Global. Márvio Lúcio - o Carioca, está muito mal aproveitado, pois com todo o seu talento, está num papel caricaturado à la A Praça é Nossa.

Durante a coletiva, Calvito contou que começou a escrever o roteiro em 2007, e após oi prédio onde morava desabar, sua mulher encontrou o roteiro nos escombros.


Ele conta que este filme foi a primeira vez de vários deles: dele como diretor de ficção, de Eduardo Albuquerque como roteirista de longa-metragem, de Calabresa como protagonista, de Alberto Graça e do Carioca, respectivamente como produtor e ator de longa.

Com um orçamento de 4,5 milhões de reais, o lançamento de 150 salas deve atrair apenas aqueles fãs do elenco, uma vez que o filme não entrega a graça que promete. O título parece uma brincadeira de mal gosto com quem acredita que o filme possa fazer sucesso nas bilheterias.



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O AGENTE DA UNCLE (The Man from U.N.C.L.E.)


por Tiago Lira
É muito bom sair satisfeito ao final de uma projeção. Em O Agente da U.N.C.L.E. Guy Ritchie trouxe um misto de ação e comédia que, comercialmente falando, será compreensível se não fizer sucesso. O problema estará nas comparações que serão feitas por causa das produções como temas parecidos que estrearam esse ano, o que não diminui a qualidade do filme. Então, não deixe que isso o impeça de se divertir com essa aventura cheia de ação, personagens cativantes e que representa belamente o período da Guerra Fria. E não se preocupe por essa ser uma adaptação de uma série televisiva: uma das maiores qualidades do filme é que ele foi feito mais para quem não era fã do que para quem era.

Sendo inglês, o diretor quebra um paradigma do herói americano perfeito ao representar Napoleon Solo (Henry Cavill) com vários defeitos. Durante o flashback de Ilya Kuryakin (Armie Hammer) descobrimos que Solo só trabalha para a CIA porque ele é muito bom no que faz; um ladrão que busca se livrar das garras da justiça. E notem como é inteligente a decisão de Ritchie mostrar o personagem entre a sombra e a luz nesse momento, reforçando sua personalidade. O diretor também dá a devida atenção à Gabriella Teller (Alicia Vikander), e em poucos minutos estabelece uma relação dela com o pai – no carro, enquanto trabalha no motor, sem relegá-la a eye candy – um cientista que Solo está procurando. Já Ilya tem algo de atual na sua representação, pois ele nem parece humano – o que remeteu a vários momentos uma piada vinda da internet – e é sensacional como o diretor usa do design do som para representar a personalidade perturbada do agente da KGB, com tambores e bumbos preenchendo sua mente.

A mudança do paradigma, representada pela união relutante de Solo e Ilya, ainda que não provoque uma profunda discussão, pinta um quadro do que foi o período de transição para o fim da guerra fria. Essas duas forças opostas teriam que se unir pelo mal comum, e não quer dizer que eles deveriam gostar disso, o que trás momentos memoráveis. Desde o enfrentamento no banheiro, a cena onde vários agentes disfarçados se levantam para que Solo e Ilya conversem – o que estava mais para um cheiro de cadáver se espalhando – ou tentando sempre se superar nas tecnologias feito duas crianças.

Ritchie também é competente em momentos mais técnicos da história, sendo que a mise-en-scène é o destaque mais interessante. O design de produção tem ótimas representações da época, passando pelos figurinos, pelo design dos carros – principalmente os da pista de corridas – e na paleta de cores que dá um ar de fidelidade sessentista à produção, juntamente com a música de Daniel Pemberton. Outras decisões do diretor como o flashback ser apresentado por slides; ou a câmera que segue o braço de Ilya enquanto busca uma arma e mais tarde acompanha a porta do cofre que os dois agentes invadem são esteticamente funcionais e elegantes. Diferente do exagero dos ângulos holandeses e a necessidades de flashbacks explicativos de coisas que aconteceram a menos de um minuto na narrativa.

O diretor ainda consegue equilibrar muito bem os momentos de ação e comédia, e percebe-se esse tato, por exemplo, ao representar Solo como bem mais desgraçado que sua contraparte russa – fugindo assim de clichês. É de chorar a cena em que Solo consegue escapar dos seguranças de um complexo enquanto observa Ilya tendo que lidar com a situação. Enquanto o americano fica confortavelmente assistindo a cena ao som de música clássica e uma cesta de pão, queijo e vinho que encontrou num caminhão. Ritchie já havia separado a personalidade dos dois mais cedo, quando mostra o jeito que os dois resolvem passar o tempo: enquanto Ilya está tentando jogar xadrez, Solo está mais interessado na balconista do hotel. E para os mais ávidos das cenas de ação, há espaço para explosões, socos e muitos tiros enquanto nos divertimos com algumas coisas que acontecem ao fundo.

O filme fecha com muito melhores momentos do que ruins, e vale a pena apreciá-los. Pode ser perceber o timming da comédia quando vemos que a música de Pemberton para no exato momento em que Victoria (Elizabeth Debicki) abre a porta do quarto de Solo, a transição de uma imagem de satélite para a fotografia noturna, ou montagem perto do fim do terceiro ato para manter a ação do longa sem que ele se esticasse além da conta. O Agente da U.N.C.L.E. é espirituoso, divertido e o melhor filme do diretor nos últimos anos. Felizmente, o Ritchie e seus – muitos – roteiristas prefeririam contar a história para um público mais jovem, respeitando alguns elementos do original, mas sem se apegar a eles, ainda que exista aquela sensação de nostalgia no ar para quem era fã da série.


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HOMEM IRRACIONAL (Irrational Man)


por Beto Besant
Com uma das mais extensas filmografias dentre os cineastas em atividade - cerca de 50 - Woody Allen é daqueles que oscilam entre geniais e "acima da média".
Pra quem vai ao cinema à procura de uma comédia, de dar risadas, vai se frustrar. O filme é um drama com pitadas de suspense psicológico que em certos momentos lembra seu Match Point (2005).

Na trama, Abe Lucas (Joaquin Phoenix) é um professor de filosofia que volta à pequena cidade de Rhode Island para lecionar na Braylin College. Seu nome é cercado de mítica de um homem sedutor e interessante. Porém o homem que chega à cidadezinha é um alcoólatra completamente decepcionado com a vida, que não encontra motivação para absolutamente nada e passa os dias grudado à sua garrafa de bolso, sempre cheia de whisky.

Seu negativismo e autodestruição chamam a atenção de sua colega Rita (Parker Posey) e de sua aluna Jill (Emma Stone), apesar de ambas serem comprometidas. Após ouvir sem querer uma conversa num restaurante, o professor descobre um motivo para viver e sua vida ganha novo colorido.

Aqui, o diretor mantém seu estilo: muitos diálogos porém bastante inteligentes, e os acasos que interferem na vida das pessoas. A história possui poucos personagens e nenhuma trama paralela, talvez para não desviar o foco da trama.

O elenco foi muito bem escolhido. Phoenix encarna com perfeição uma espécie de alter-ego de Allen, desde sua postura corcunda e sua barriga proeminente até sua inconfundível cicatriz no lábio superior. Emma Stone - em seu segundo trabalho seguido com o diretor - também está muito bem no papel da estudante inteligente e atraente, que mesmo sendo cobiçada pelos garotos prefere a inteligência do professor, apesar deste não ser nenhum modelo de beleza e elegância.

Apesar de ter um ritmo meio lento, o filme consegue surpreender e manter o expectador atento até seu desfecho, uma vez que - o contrário de muitos outros - nunca deixa o público com a sensação de saber o que irá acontecer.
Apesar de não ser um Woody Allen em sua melhor fase, todo trabalho do diretor é digno de ser apreciado.


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