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CAÇADORES DE OBRAS-PRIMAS (Monuments Men)


por Antonio Carlos Egypto

Como é possível preservar obras de arte fundamentais para a história da humanidade em meio aos bombardeios e aos saques, roubos, promovidos pelos nazistas? Hitler tinha como projeto o maior museu de arte do mundo, meticulosamente planejado, e já havia feito o registro das obras artísticas naquele que seria o maior roubo da história, envolvendo 5 milhões de objetos culturais. Ao mesmo tempo em que efetuava esse grande roubo, destruía a arte contemporânea inovadora e crítica, queimando obras de Picasso, por exemplo. Para o nazismo, essa arte era degenerada e tinha de desaparecer. Parece, mesmo, um milagre que o grande acervo cultural da humanidade tenha sobrevivido a essa insanidade toda, da mentalidade nazista e da própria guerra.

Caçadores de Obras-Primas, filme dirigido e protagonizado por George Clooney, se baseou no livro Monuments Men, de Robert M. Edsel, que conta a história de um grupo de homens, um batalhão especial, que se dedicava a salvar obras de arte roubadas, em meio à guerra. Esse grupo, que envolveu homens e mulheres, chegou a ter 350 soldados, de 13 países. Foi a maior caça ao tesouro de que se tem notícia. Começou em 1943, quando o Eixo começava a perder a guerra, e se estendeu até 1951. Na realidade, até hoje se estão encontrando obras perdidas durante a guerra e, surpreendentemente, em grande quantidade, segundo relato de diversas publicações atuais.

Entre as obras-primas que foram perseguidas e resgatadas pelos Monuments Men havia pinturas de Rembrandt, Leonardo Da Vinci, Vermeer e até a Madonna, de Michelangelo, saqueadas de coleções particulares, sobretudo de judeus, igrejas e museus. O livro e também o filme registram a atuação de uma dezena de soldados atuando no resgate das obras, principalmente na França, Bélgica e Alemanha.


A história, sem dúvida, é muito boa e atualíssima. Escrita por um texano que se mudou para Florença para estudar artes e foi aí que se questionou sobre como as obras-primas da civilização ocidental tinham sobrevivido à Segunda Guerra Mundial. Transformou em romance a trajetória desses homens dedicados à arte e seu heroísmo único, com base em extensa pesquisa que visava a resgatar essa verdade histórica tão positiva, abordando a guerra por um novo ângulo. Aliás, são infindáveis os ângulos pelos quais ainda se pode falar da Segunda Guerra Mundial, um assunto que parece inesgotável.


O filme Caçadores de Obras-Primas, além de contar com a figura carismática de George Clooney, desta vez também na direção, teve um elenco estelar vivendo os heróis da guerra pela arte. Matt Damon, Bill Murray, John Goodman, Cate Blanchett e até o astro francês de O Artista, Jean Dujardin, fazem parte do elenco. A produção é bem cuidada. É um filme bem feito.

Algumas coisas incomodam, no entanto. A visão heróica, desprendida, dos Monuments Men, seu patriotismo e destemor, são clichês de filmes de guerra. Os personagens, ainda em 1943, se comportam como se já soubessem de tudo o que viria após o fim da guerra que, diga-se, ainda não estava ganha.


A narrativa é convencional e deixa para os minutos finais de suspense a peça mais importante. Ou seja, o esquema previsível de sempre. Não há inovações, quando muito, reverência aos antigos filmes de guerra. Para uma história tão interessante como essa, o filme deixa a desejar. Não empolga, não brilha. E teria tudo para entusiasmar. Mas nem por isso deixa de ser um filme interessante de se ver. É só não esperar demais.


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QUANDO EU ERA VIVO


por Antonio Carlos Egypto

O cinema brasileiro explora pouco o gênero do horror, do fantástico. Com a relevante exceção de José Mojica Marins, o Zé do Caixão. Fora ele, pouca gente tem se aventurado. Marco Dutra, em parceria com Juliana Rojas, já havia feito uma ótima incursão nesse terreno, com o filme Trabalhar Cansa, de 2011, partindo do realismo do mundo do trabalho, de forma concreta, para chegar a monstros emparedados.

Em Quando Eu Era Vivo, Marco Dutra dirige uma adaptação do livro A Arte de Produzir Efeito Sem Causa, de Lourenço Mutarelli. O autor do livro tem uma participação especial no filme.

Os temas trabalhados são os vínculos familiares, os fantasmas que por ali circulam e a questão de como lidar com o passado, que assombra, pode paralisar, mas foi quando os afetos se consolidaram. A loucura, o bem e o mal, não poderiam faltar ao gênero. Mas o interessante aqui é que seus limites e possibilidades estão bastante borrados, de modo que é difícil saber o que é uma coisa e o que é a outra. Esse suspense se sustenta até o fim do filme e traz surpresa.

O embate fundamental se dá entre Júnior (Marat Descartes), recém separado por meio de um divórcio traumático, que retorna à casa paterna, e Sênior (Antonio Fagundes), seu pai viúvo, que está tratando de reconstruir sua vida. Júnior se apega ao passado, às lembranças da mãe e do irmão, agora ausente, internado numa clínica. Sênior, ao contrário, enfurnou as coisas do passado num quartinho fechado e tem um apartamento que respira atualidade, preocupações com a saúde e o bem-estar.

A casa é, por sinal, um personagem central do filme. É pelas transformações que vão ocorrendo nela que se configuram os mundos do pai e do filho. Até as cores de iluminação mudam. Do começo para o meio e o fim do filme, a casa se transforma passo a passo, dando lugar às lembranças, obsessões e fantasmas que povoam a vida dessa família, pela ótica de Júnior, em contraponto à do pai. E vão se revelando as coisas não resolvidas da família.

A personagem Bruna (a cantora Sandy), jovem estudante de música, é inquilina na casa e servirá de elemento catalisador das loucuras de uma família da qual ela não faz parte. O irmão ausente, Pedro (Kiko Bertholini), terá sua presença na vida adulta e atual de Júnior e Sênior. Mas os dois irmãos, na infância, e a mãe que morreu, estão presentes no filme pelos registros do passado. A solução do diretor foi filmá-los em VHS e, assim, incluí-los na história. A solução é muito boa, porque a imagem remete ao passado recente dos videocassetes, suas imperfeições e riscos, assim como à cor amarelada.

Misteriosas cabeças de gesso adicionam o elemento fantástico que agrega mais suspense à trama. A filmagem e a interpretação do protagonista-filho nos fazem lembrar do clássico O Iluminado, de Stanley Kubrick, de 1980, em alguns momentos, assim como de outros filmes de terror. Mas Quando Eu Era Vivo explora principalmente o horror psicológico, o das mentes conturbadas, o dos impulsos e dos medos. A violência é moderada e não há sangue jorrando. É tudo mais sutil, situa-se no mundo interno dos personagens.

Um ótimo elenco dá boa sustentação à trama de horror que se desenvolve. Marat Descartes tem se revelado um ótimo ator, com presença marcante em bons filmes brasileiros. Foi o protagonista de Trabalhar Cansa, do mesmo diretor e de Super Nada de Rubens Rewald, por exemplo. Antonio Fagundes é sempre um grande ator em cena, seu Sênior é muito convincente. Sandy Leah canta e lida com música no filme, o que a liga a seu universo habitual, está bem no papel de Bruna. O personagem de Gilda Nomacce se insere na trama com uma atuação cativante. Tuna Dwek participa de uma sequência do filme, pequena, mas muito intensa, um momento forte da história. Não dá para esquecer.

O diretor Marco Dutra reafirma seu talento e se qualifica para novas incursões num gênero de terror que não se distancia do mundo em que vivemos e onde estamos, dialoga com ele, revela seu avesso.


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A MENINA QUE ROUBAVA LIVROS (The Book Thief)


por Beto Besant

Sempre que se cogita adaptar um livro para o cinema, ainda mais no caso de um best seller, a primeira coisa que se especula é se o filme será fiel ao livro. Como dizia Tim Maia: "Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa". Há que se diferenciar cinema de literatura. O cinema não tem obrigação nem deve manter fidelidade ao livro. E se for preciso antes ler o livro para "entender melhor a história" é porque o filme não foi bem executado. Portanto, vou me ater à obra cinematográfica, o que motiva estes comentários.



Na história, Liesel Meminger (Sophie Nélisse) é enviada junto com seu irmão para morar com um casal alemão - mediante pagamento, uma vez que sua mãe é perseguida pelo nazismo. No caminho seu irmão morre e ela rouba o primeiro livro durante o enterro.

Seu pai adotivo Hans (Geoffrey Rush) é um bom homem, sempre carinhoso e compreensivo, que em muito lhe ajuda a superar as dificuldades de sua nova vida. Por outro lado, sua mãe adotiva Rosa (Emily Watson) é disciplinadora e rígida.


Na escola, a garota conhece o jovem Rudy (Nico Liersch), menino alemão que nutre uma paixão platônica pela garota. Ela porém, deixa subentendido o mesmo tipo de sentimento por Max (Ben Schnetzer), judeu cuja mãe foi morta e seu pai fez muitos favores aos donos da casa, e por isso aceitam a perigosa missão de lhe esconder no porão da casa. Hans e Max lhe ensinam a ler e incentivam para que pegue gosto pela leitura. Conforme surge alguma oportunidade, a menina rouba algum livro.

A história é contada de forma falha e os horrores da guerra são muito suaves comparados aos relatos conhecidos. A direção de Brian Percival erra ao tentar abordar o tema de forma leve, para atingir a todos os públicos, principalmente as crianças - que poderiam se identificar com Liesel e Rudy. O elenco está bem, com desataque para Geoffrey Rush e Emily Watson, que encontram o tom de seus personagens sem caírem no caricato. A fotografia e direção de arte são primorosas, mas o filme peca em tentar arrancar a emoção a todo custo com a trilha melodramática de John Williams.

Mesmo que adaptado, um filme não tem que depender do original, nem por obrigação de manter-se fiel ao livro, nem para que o público possa compreender a história. Este é o típico caso de filme que não se sustenta por si próprio.


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