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O ABRAÇO DA SERPENTE (El Abrazo de la Serpiente)

O Abraço da Serpente : Poster

por Antonio Carlos Egypto

Os relatos de dois cientistas e exploradores da região amazônica são a base do roteiro do filme colombiano O Abraço da Serpente, dirigido por Ciro Guerra. O etnólogo alemão Theodor Koch-Grünberg (1862-1924) explorou a região amazônica da América do Sul e estudou os povos da floresta. Morreu no Brasil, na cidade de Boa Vista. O botânico norte-americano Richard Evans Schultes (1915-2001) explorou a mesma região, interessado especialmente em uma planta, descoberta e citada nos relatos de Koch-Grünberg: a yakruna.


O filme constrói uma narrativa que dá vez e voz aos conhecimentos, crenças, lendas e tradições dos povos indígenas da região da Amazônia colombiana, a partir do personagem Karemakate, em dois tempos. Primeiro, como último sobrevivente de seu povo, vivendo isolado selva adentro. Desconfiado e crítico, por razões óbvias, do homem branco e da exploração da borracha, que trouxe a desgraça e dizimou seu povo. Depois, em outro tempo, como um xamã esquecido, perdido na sua mata, vivendo problemas de identidade em decorrência das faltas de referência e de memória.


Nos dois tempos, há o convívio complexo e conflitivo com os cientistas exploradores. E também a possibilidade de aprender com brancos que não desejam destruir os aborígenes ou explorá-los, mas conhecê-los, valorizá-los, divulgar seus conhecimentos.

A narrativa se desenvolve na forma de uma aventura, que traz perigos, desencontros e vai revelando o que se encontra nessa floresta: o que resta de seus povos de origem, a exploração a que estão expostos, o uso religioso equivocado e autoritário, encontrado em alguns locais. Com direito a manifestações tresloucadas e messiânicas, que não libertam, oprimem.

A natureza é exuberante, evidentemente. E bem explorada nessa aventura. Uma bela fotografia em preto e branco se encarrega de ressaltá-la. O nosso anseio estético pediria que o filme fosse a cores. Seria ainda mais atraente. Poderia se tornar mais exótico, turístico e não tão propenso ao uso reflexivo? Não creio. Em dois momentos, no início e no fim do filme, imagens de formas geométricas a cores são inseridas. Remetem ao futuro? À passagem do tempo?

Sem dúvida, o tempo joga um papel relevante em O Abraço da Serpente. Coisas, lembranças, memórias, são levadas pelo tempo. Povos inteiros se desfazem e desaparecem, ao longo do tempo. Pela ação predatória dos seres humanos, toda uma tradição e uma identidade tendem a desaparecer. Se considerarmos que metade da superfície da Colômbia está na região amazônica, há aí uma forte perda do próprio significado de nacionalidade.

Que sentido tem hoje para todos nós a busca por uma planta divina que cura e ensina a sonhar? Essa foi a razão de ser de uma expedição científica em busca dessa planta, a yakruna, que, na realidade, simboliza a própria existência de, pelo menos, um povo indígena que está desaparecendo.


O resgate do conhecimento dos povos na floresta, intimamente relacionado à vivência com a selva, sua água, seus animais, sua multiplicidade de plantas, envolve uma questão cultural, antropológica, da maior relevância. O filme contribui para valorizar tudo isso, apontar para o que está sendo perdido e o que ainda pode ser recuperado, por meio de um personagem indígena que é o centro da narrativa. Através dele nos integramos à realidade da floresta amazônica, que também nos diz respeito e muitas vezes nem nos damos conta disso.

O elenco de O Abraço da Serpente nos leva para dentro da dimensão amazônica, como se estivéssemos fazendo parte daqueles povos e dos exploradores que vêm do mundo desenvolvido, em busca de sua cultura. É muito convincente o desempenho dos atores. Trata-se de uma experiência que vale a pena e mostra a força do cinema colombiano atual. O filme está entre os cinco finalistas do Oscar 2016 de filme estrangeiro, o que é um reconhecimento importante, em termos de mercado.


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