por Tiago Paes de Lira
Jersey Boys: Em Busca da Música é um filme direcionado a um nicho, os fãs dos Four Seasons e daquele estilo musical influenciado por Frank Sinatra. As músicas que são tocadas ao longo do filme com certeza emocionaram alguns, mas a narrativa em si não deslancha. Isso não quer a história verdadeira tenha sido desse jeito, mas assim foi apresentada na tela. Para quem viveu a época, servirá para relembrar os momentos enquanto encara uma história desinteressante.
O filme conta como Frank Valli (John Lloyd Young) saiu de um trabalho como barbeiro em Nova Jersey para se tornar um dos cantores mais famosos de seu tempo ao formar o Four Seasons junto com Tommy DeVito (Vincent Piazza), Nick Massi (Michael Lomenda) e Bob Gaudio (Erich Bergen). A história discursa a relação deles com a máfia, o sucesso, perdas e um pouco do processo criativo de músicas como Sherry, My Eyes Adored You e Can’t Take My Eyes Off You.
O diretor Clint Eastwood busca uma relação intimista com o público do cinema. E para isso ele coloca Tommy DeVito – e outros, eventualmente – quebrando a quarta parede, falando diretamente com o espectador, num papel onisciente de tudo o que viria nas duas horas de filme. Ao fazer isso, o diretor mostra a personalidade de Tommy em pouco tempo: cheio de si, confiante e arrogante. O personagem chega a dizer que se não fosse por ele, seus amigos seriam nada ou, pior, estariam mortos com um tiro na cabeça. Essas características se mantem por praticamente todo o filme, com Tommy sempre desmerecendo o talento de Frank e dos outros.
O diretor busca, em paralelo, humanizar os personagens. Isso se dá com Frank e os outros – ao mostrar seus vícios e defeitos – e com Angelo “Gyp” DeCarlo (Christopher Walken), membro de uma das famílias criminosas de Nova York nos anos 1950 e 1960. Gyp chora em determinado momento de emoção, quando vê Frank cantando uma música que era a preferida de sua mãe. Esse momento cria uma relação com o cantor, e os negócios escusos de Gyp são relevados. Eastwood opta por não mostrar o lado violento da história, o que amacia a figura dos agiotas. O máximo que acontece é uma brincadeira que Gyp faz ao ser cortado acidentalmente por Frank numa cadeira de barbeiro quando diz “o que é um pouco de sangue?”, como se dissesse que Gyp viu bem mais que isso.
E há outras brincadeiras que funcionam no filme, como um painel da casa de Frank retratando ao mesmo tempo o Papa e Frank Sinatra e a aparição de Joe Pesci (Russo) – sim, o ator – quando diz uma das suas linhas mais conhecidas de Os Bons Companheiros (Godfellas, 1990, Dir Martin Scorsese), e no começo do 3º ato a explosão que Nick quando conta o inferno que é compartilhar o quarto com Tommy durante as turnês – cena que é a mais engraçada da projeção. E, para não estragar a surpresa, sugiro que procurem o momento em que o próprio Clint Eastwood aparece num cameo nada tradicional.
Os melhores pontos do filme estão no design de produção e figurino espetaculares – ambientando bem a época – e as músicas. Eastwood optou por gravar ao vivo, tanto os vocais quanto os instrumentais, o que dá uma sensação fantástica de querer dançar e cantar com os atores em cena. Se você gostar do estilo, claro. Em linhas gerais, é correto dizer que o filme é uma grande ode à música.
Há outras decisões de muito bom gosto na direção de Eastwood. Percebe-se a iluminação gradual na fotografia – saindo do anonimato para a fama –; a posição em que Tommy é mostrado em vários planos, se sentindo superior aos outros, apenas para ser confrontado por um Frank mais forte e maduro, dessa vez tomando a maior parte da tela e claramente superior; e o uso restrito do flashback nos problemas financeiros de Tommy, onde só então percebemos, junto da banda, que a situação era bem pior que se imaginava. E há um momento particularmente emocionante, envolvendo um funeral, a música My Eyes Adored You e a criação da talvez mais conhecida música cantada por Frank Valli.
Apesar dos bons momentos, Jersey Boys: Em Busca da Música tem vários problemas. O filme vai reacender memórias – na sessão em que estive percebi que os mais velhos riram muito mais do que eu – mas é preciso mais do que nostalgia para marcar. A coreografia final é a parte mais interessante do filme (com What a night em flash mob), apresentando um final feliz para uma relação que vemos não acabou muito bem. Uma pena, mas nem as partes mais agradáveis conseguem salvar a experiência.
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