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UM SENHOR ESTAGIÁRIO (The Intern)


por Tiago Lira

Há um conceito errado e até bem difundido sobre desligar o cérebro pra assistir certos filmes – tema discutido na edição 24 do nosso podcast –, uma falácia que não deve ser aplicada nem mesmo em filmes leves e simpáticos como é o caso de Um Senhor Estagiário. É uma produção que não ofende ninguém e é feito para qualquer pessoa, como podemos ver pela fotografia bem iluminada e na razão de aspecto 16:9, o widescreen dos modelos de TV atuais. De vez em quando é bom se deixar levar sem precisar pensar em conflitos, o que é bem diferente de desligar alguma parte sua que não se pode. Mas não dispense essa comédia pois, no fundo, ela tem um quê de representatividade.

A diretora e roteirista Nancy Meyers faz uma brincadeira com o título que vale a pena destacar. Apesar de remeter Ben Whittaker (Robert De Niro), toda a história vai avançando naturalmente para mostrar a verdadeira protagonista. Ainda que a justificada narração off inicial dê destaque ao septuagenário, você vai notar que toda a narrativa é em torno da atarefada Jules Ostin (Anne Hathaway) – personagem que parece uma evolução de Andy Sachs (de O Diabo Veste Prada, 2006). Os problemas que ela enfrenta serão acompanhados de perto por Ben, que representa a audiência dentro do filme. Com exceção de uma narração off de Jules, que poderia ser traduzida simplesmente pelo olhar que ela dá para uma bagunçada mesa, sabemos o que o estagiário sabe, o que em determinado ponto chega a ser agoniante por um segredo que ele guarda.

Meyers consegue construir personagens ótimos, carismáticos e tridimensionais e quais podemos gostar, desde a dupla principal até os coadjuvantes. Ben é uma pessoa extremamente adorável, talvez aquele que a maioria de nós nunca será: observador, natural, se desataca – por motivos que vão além de sua idade – e é bom com todos, inclusive com quem não mereceria (como o motorista de Jules) e se torna impossível não gostar dele. Os outros personagens são automaticamente atraídos para ele de forma natural. Isso parece refletir a própria personalidade do ator, que podemos confirmar na relação paternal de Ben com Jules – representada pela mãe dela que só ouvimos a voz e do filho dele que nunca vimos a cara.

Em determinado ponto você tende a se perguntar de onde virá o conflito, pois estamos tão acostumados ao clichê de ter que acontecer alguma coisa entre esses dois, que esperamos isso a cada minuto de projeção. Interessante que Meyers não explora esse clichê e a rusga entre os dois se resolve tão rápido que nem vale a pena se remoer por isso. O que reforça a escolha não tão clara de Jules como a protagonista, pois os conflitos são inteiramente dela: as conversas com a mãe, a situação com o marido, o julgamento de outras mães e o fato dela liderar uma companhia de sucesso. Então, entre ela e Ben não existe essa necessidade.

Isso não quer dizer que o filme escape de outros clichês. Ben parece ser o tio mais legal do mundo, portanto fica óbvio desde os primeiros minutos é que ele quem vai resolver o problema de moradia de Davis (Zack Pearlman), um jovem estagiário. Ou ainda que vá existir uma relação com a massagista da empresa, Fiona (Rene Russo), sendo eles os mais seniores da equipe. Para dosar essa sensação há momentos que são feitos para todo mundo sair com o maxilar doendo de tanto rir. Duas cenas de massagem protagonizadas por Fiona e Ben – piadas sexuais, mas contidas – e o roubo que é protagonizado pelos estagiários são exemplos de como essa produção é despojada sem ser forçada.

Há filmes mais marcantes sobre o envelhecer e sobre como se destacar num mundo onde você era o dominado e não o dominador, que é o papel tanto de Jules quanto de Ben – ela numa posição majoritariamente masculina, no qual acha que buscar a solução para tirar o peso dos ombros ajudará no casamento e no papel clássico de mulher/esposa/mãe; e ele buscando um lugar num mundo de jovens – mas Um Senhor Estagiário é tão cheio de bons momentos, sejam eles simbólicos ou visuais, que é fácil dizer que saímos da sessão conquistados, leves, edificados e nos sentindo para cima. Algo que precisamos de vez em quando.


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