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OS OITO ODIADOS (The Hateful Eight)

Os Oito Odiados : Poster

por Tiago Lira


Os Oito Odiados é longo, não economiza película – literalmente, já que a produção foi original concebida em 70mm, apesar de não podermos vê-la assim no Brasil. Por isso acaba sendo contemplativo e até difícil de acompanhar. Porém, é uma produção interessante desde a tipografia usada no título do filme, na épica trilha de Ennio Morricone, no desenvolvimento dos personagens pelos diálogos e no belíssimo contraste do vermelho com o branco. O clima de mistério envolvente nesse faroeste invernal – algo bem incomum no gênero – não é o melhor trabalho do diretor, mas ainda é um bom filme com o já tradicional humor e ação de Quentin Tarantino.

A cena inicial do filme trem aproximadamente cinco minutos. É um plano longo mostrando uma carroça vinda ao longo de uma imensidão branca à enquanto vemos os créditos do filme. Já é suficiente para entender o clima que, apesar da contemplação e do símbolo da figura de Cristo enterrada na neve, poderia sim ser diminuída. Se há algo para se reclamar do filme é esse exagero dos seus 160 minutos – algo que Bastardos Inglórios e Django Livre pareciam não ter.

O que temos a seguir, nesse e no ato seguinte, é um road movie onde Tarantino desenvolve a personalidade distinta de metade dos oito odiados. Daisy Domergue (Jennifer Jason Leigh) é mais louca, porém perigosa. Ela é uma mulher tão forte – num sentido mais figurado que literal – que precisar ser presa em correntes. Ainda nessa situação, ela confronta John “O Carrasco” Ruth (Kurt Russell), um caçador de recompensas desconfiado e dono de mais força bruta. O Major Marquis Warren (Samuel L. Jackson) é mais prático e seguro de si e, como vamos entender melhor mais à frente da narrativa, sabe o que precisa fazer para sobreviver num país assolado pelo racismo.

Chris Mannix (Walton Goggins) aborda a carroça durante essa viagem, servindo de elo entre atos ao se apresentar como o novo xerife de Red Rock, onde Ruth será enforcada e Ruth receberá sua recompensa. É nesse momento em que Tarantino planta habilmente a semente da desconfiança dessas pessoas. Elas estão lá por ser o que dizem ser e é uma incrível coincidência estarem ali? Com isso, você volta alguns minutos atrás e se pergunta até se os motivos de Warren são verdadeiros.

Com os novos personagens isolados começamos a pegar as inspirações de Tarantino para essa nova produção. Ecos de O Enigma do Outro Mundo e o romance E Então Não Sobrou Nenhum (de Agatha Christie, também conhecido como O Caso dos Dez Negrinhos) estão lá para quem quiser ver. Bob (Demián Bichir), Oswaldo Mobray (Tim Roth), Joe Gage (Michael Madsen), e Sanford Smithers (Bruce Dern) podem ser ou não o que dizem. E essa duvida vai corroer não só Warren, Ruth e Mannix, mas também o espectador, auxiliado por uma narração off, mas sutil, que mostra detalhes que perdemos por causa de uma discussão entre o soldado negro e Smithers, um general confederado e tão racista quanto o novo xerife.

Outra grande qualidade da produção, se não for a maior, é a ausência de heróis. Não quer dizer que o protagonista – e que desafio é determinar quem seja – não passe pela chamada “jornada do herói”, mas cada um dois oito são bem desgraçados, cada um a sua maneira. São personagens tão detestáveis que você dificilmente gostaria de viajar com eles, o que se reflete na hesitação de O.B. Jackson (Parks) em receber mais gente em sua carroça.

Em outros filmes Tarantino usou a figura do oprimido contra o opressor – uma mulher em Kill Bill, os judeus no já citado filmes de 2009 – e aqui repete o papel do negro como já tinha sido em 2012. Não é à toa quando digo que esse filme é uma representação de parte da história dos EUA, o que fica bem explícito em um dos diálogos de Warren com Ruth sobre uma carta que o antigo combatente sempre leva consigo, escrita pelo então presidente Abraham Lincoln. E também no embate que Warren tem com Smithers, mostrando o que um negro tem que fazer para sobreviver na América – mostrando o grande ator que o personagem é.

Com boas surpresas e cheio de diálogos inteligentes, Os Oito Odiados tem alguns problemas na escolha do diretor de alongar demais a narrativa, o que pode tornar a experiência maçante para alguns – provavelmente o montador Fred Raskin não tem o poder que Sally Menke tinha no diretor. No entanto, demora bem pouco para as cenas interessantes acontecerem – a cena com Warren sentado em três cadáveres empilhados na neve enquanto espera que alguma carroça apareça é impagável. É uma eficiente mistura de violência, comédia e tiros. Poderia ser menos violento? Sim, mas não seria Tarantino.


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