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O JUIZ (The Judge)


por Beto Besant

Apresentado como um "filme de tribunal", O Juiz tem um subtexto muito mais profundo e maduro.

Na trama, Hank Palmer (Robert Downey Jr) interpreta o típico advogado bem sucedido e sem escrúpulos, rico e casado com  uma bela mulher. Ao ser informado da morte de sua mãe, volta à cidade natal para participar do funeral, reencontrando seus dois irmãos (Vincent D'Onofrio e Jeremy Strong) e seu pai Joseph Palmer (Robert Duvall), com quem não mantém nenhum relacionamento. O velho Palmer é um juiz "à moda antiga", daqueles que levam a justiça à últimas consequências - no melhor sentido.

A volta traz à tona o passado do advogado, com os problemas pessoais de seus irmãos e o reencontro com sua ex-namorada Samantha (Vera Farmiga).

Sendo pai e filho pessoas diametralmente opostas, Hank se põe o mais rápido possível num avião para voltar à sua rotina, mas é informado que seu pai se envolveu em séria confusões por conta de um atropelamento que nega-se a admitir.

É aí que entra em jogo a questão mais importante e sutil do filme: tentando aproveitar cada minuto com a pessoa que mais ama - e que não consegue manter um simples diálogo sem terminar em discussão, o filho tenta perceber em que momento pai e filho se afastaram emocionalmente.

Produzido pela Team Downey - de Downey Jr e sua mulher Susan Downey, tem uma estrutura clássica com claros pontos de virada na trama. O que poderia ser uma limitação se mostra eficiente para dar suporte a este verdadeiro "filme de ator". Mais do que um filme de tribunal, um filme de família ou um filme de volta às origens, O Juiz aborda com delicadeza o sentimento de perda iminente de filho para pai. Talvez seja um tema que seja mais sensível aos que possuem maior experiência de vida - não necessariamente os mais velhos.

O roteiro é do estreante Bill Dubuque com Nick Schenk (Gran Torino) e peca no excesso de tramas, como o passado de atleta do irmão mais velho de Hank, sua quase retomada do romance juvenil e a suspeita de incesto.



Dirigido por David Dobkin (de Penetras Bons de BicoBater ou Correr em Londres e Eu Queria ter a sua Vida), acerta em não tentar fazer exercício de estilo, deixando o filme ser conduzido pelos protagonistas Duvall e Downey Jr. É o típico filme de ator, onde Duvall dá um show de interpretação, ofuscando até o excelente parceiro. O filme trás ainda uma bela participação de Billy Bob Thornton como promotor obcecado.

A montagem erra ao se alongar para arrematar as diversas (e dispensáveis) tramas, levando a película a duas horas e quarenta minutos.

Se o filme tem alguns excessos, é certamente uma boa opção em épocas onde se busca o público de forma acomodada com histórias de super-herói ou recorre-se a efeitos especiais para suprir a falta de bons roteiros.



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THRASH - A esperança vem do lixo


por Eduardo Oliva

Trash talvez seja um dos filmes brasileiros mais forçados que já assisti nos últimos anos. Em se tratando de favela movie, é uma carona requentada – para gringo sambar e contemplar – de sucessos vanguardistas que vem lá de Rio 40º (do cineasta Nelson Pereira dos Santos), passa por Cidade de Deus (com a participação especial de Zé Pequeno - Leandro Firmino da Hora, um pouco mais acima do peso), e aterrissa nas participações sem sintonia de Martin Sheen e Rooney Mara.


Produzido pela O2 Filmes (de Fernando Meirelles) e dirigido por Stephen Daldry (As Horas, Billy Eliot), Trash é uma coprodução de Brasil, Inglaterra e Alemanha. O longa já começa com uma cena de perseguição envolvendo o personagem de Wagner Moura (José Ângelo) para logo em seguida desencadear numa série de acontecimentos envolvendo o seu paradeiro. No meio deste jogo, somos apresentados a um policial corrupto (Frederico, interpretado por Selton Melo) e a três meninos sobreviventes de um lixão, especialmente construído para o filme.

Raphael, Gardo e Rato são o fio condutor do roteiro, escrito por Felipe Braga e Richard Curtis a partir do livro de Andy Mulligan. É curioso como a estética da favela, os sotaques cariocas e o jeito malandro típicos da ambientação do Rio de Janeiro caem no lugar comum sem trazer, absolutamente, nada de novo à narrativa. O Cristo Redentor aparece discretamente, bem como o Pão de Açucar.

Durante a exibição deste esquecível slum movie, me vieram à mente, várias vezes, cenas de Quem Quer Ser Um Milionário?, de  Danny Boyle, e Capitães da Areia – o livro. O primeiro, pelo cartaz oficial do filme com a chuva de cédulas, o contexto religioso e a personificação de uma personagem que surge como uma Santa Deus Ex Machina. O segundo, pela amizade e cumplicidade de meninos pobres que agem como anjos justiceiros diante da opressão dos adultos (aqui representada pela Polícia).

Qualquer que seja a análise que se faça de Trash, a sensação que fica é a de um longa confuso, raso, com situações e conflitos inverossímeis – as perseguições entre o trio de crianças e os policiais são sofríveis –, interpretações maniqueístas e sussurrantes (Selton Mello não convence como vilão), além de um jogo gato & rato que funciona mais como videogame, e menos como filme.

Apesar da narrativa de retalhos, Trash deve fazer carreira internacional e conquistar premiações. Acontece que santo de casa conhece bem mais os seus fiéis e, consequentemente, os seus pecados. Prova disso é o brilhante discurso de longas como Tropa de Elite 2, de José Padilha. A mensagem do Capitão Nascimento sobre a confraria do Congresso Nacional é algo que toca o espectador ao final do filme, o que não se pode dizer deste.


O ingresso vale pela trilha-musical, uma ótima opção para balada de festa americana entre amigos, em algum apartamento de classe média brasileira. Quem dá mais? 


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LIBERTEM ANGELA DAVIS (Free Angela & all political prisoners)


por Beto Besant

Ao nos deparar com um documentário como este, ficamos pensando por qual motivo documentários vão tão mal de bilheteria no país.

Dirigido por Shola Lynch e produzido por Will Smith e sua mulher, o filme conta uma história tão pouco conhecida em terras tupiniquins: Angela Davis, uma professora negra norte-americana, dona de um carisma arrebatador e discurso muito bem articulado, que decide dedicar sua vida na luta pelos direitos dos negros, provocando a ira do governo vigente.

O filme alterna depoimentos atuais de Angela e outros envolvidos com imagens e reportagens de época. Os fatos contam ainda com pequenas reconstituições para dar mais dinamismo ao filme.

A biografada conta que chegou a se relacionar com os Panteras Negras (grupo radical de luta pelos direitos dos negros) mas logo percebeu que aquele não era seu lugar, pois o machismo impediria que ela tivesse total liberdade de pensamento e atuação.

Ao se destacar em sua militância, Davis passa a receber ameaças de morte diariamente, vindo a comprar uma arma. Apaixona-se por um presidiário e logo uma tentativa de libertá-lo produz quatro mortes, onde são encontradas armas registradas em seu nome. Com isso é processada com pedido de três penas de morte.
Dessa forma acompanhamos desde a rotina de sua fuga até seus dias de prisão e julgamento.


Apesar de Angela Davis não ter o "padrão de beleza" de nenhuma modelo - ostentando uma enorme cabeleira black power e dentes afastados, ao aliar um belo e contundente discurso com um corpo esbelto e bem torneado, dá para termos a noção de quanto sua figura emblemática cativava as pessoas e incomodava o governo daquele tempo. Fica patente o objetivo de Richard Nixon (presidente), Ronald Reagan (governador) e o lendário Edgar Hoover (líder do FBI) de se livrarem dela.

Mesmo com as restrições que documentários enfrentam, este é um exemplo de uma bela trama, com elementos de policiais com suspense. Numa época em que jovens sem nenhuma consciência política vão às ruas apenas por modismo e líderes de movimentos os utilizamo apenas como trampolim para uma carreira política, é muito bom assistir a esse tipo de história verídica.

Lamentavelmente, como dito no início deste texto, pouquíssimas pessoas se sujeitarão a assistir a este belo filme.



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Cinema Grego atual: MISS VIOLENCE e METEORA



por Antonio Carlos Egypto

É fato sabido que as crises econômicas, os regimes políticos totalitários, a censura, as guerras, estimulam a criatividade artística. Grandes expressões da arte resultaram de momentos de crise, em sentido coletivo, mas, também, individual. Crises existenciais são geradoras de grandes obras. Já que a crise é também oportunidade de rever, repensar, ressignificar, buscar alternativas, o que se poderia esperar da produção cinematográfica do país que foi mais abalado, na comunidade europeia, pela crise do euro?

A Grécia está representada no circuito exibidor com dois filmes que merecem ser vistos e que se vinculam a uma expressiva produção atual, como ficou evidente na 37ª. Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em 2013, com títulos colhidos nos festivais pelo mundo. Uma presença bem mais significativa do que habitualmente acontecia no evento paulistano. O cinema grego apareceu com força e qualidade.


MISS VIOLENCE. Grécia, 2013. Direção: Alexandros Avranas. Com Themis Panou, Reni Pittaki, Eleni Roussinou. 98 min.

O melhor dos filmes gregos exibidos, para mim, foi Miss Violence, segundo longa-metragem dirigido por Alexandros Avranas, vencedor do Leão de Prata de direção e melhor ator em Veneza. O filme, corajosamente, expõe a violência, o abuso e a prostituição forçada das mulheres de uma família, em suas várias gerações, e todas as consequências trágicas que daí resultam, com total realismo e procurando produzir suspense. A crise está presente no desemprego e na dificuldade de sobreviver que agravam o quadro ou, por outro lado, servem para tentar justificar ou validar a monstruosidade apresentada.

Outra leitura é possível, alegórica da situação, se olharmos para a família como representante da sociedade como um todo. A carência alimenta a opressão, o estupro, a exploração das pessoas e da mãe-pátria. Também faz sentido. E uma coisa não exclui a outra. Ao tratar do tema da exploração sexual da mulher, o contexto subjacente é o da crise social e moral em que se vive na sociedade grega atual. Mais difícil de aceitar é a visão de uma patologia individual determinando os fatos. Há um eloquente sentido de opressão coletiva, que se evidencia no desenrolar da trama e nas interpretações do elenco.




METEORA. Grécia, 2012. Direção: Spiros Stathoulopoulos. Com Theo Alexander, Tamila Koulieva. 81 min.

Outro belo filme grego que pude ver naquela Mostra refere-se a uma outra dimensão. Meteora vai em busca de monastérios ortodoxos situados acima de pilares de arenito, suspensos entre o céu e a terra, conforme explica a sinopse que consta do catálogo da Mostra. Aqui, o que se vai viver é a relação entre a fé, o afeto e o desejo sexual humanos, presentes nas figuras de um casal de religiosos. Mesmo separados em duas montanhas de pedras diferentes, uma para cada sexo, e uma escadaria interminável para galgá-las, haverá modos de se encontrar e viver essa história de amor.

Meteora é o segundo longa do diretor Spiros Stathoupoulos. É o filme mais bonito visualmente dessa leva de gregos. Tem locações belíssimas, um clima que o situa fora do mundo real e uma muito eficiente atuação do desenho de animação, que se insere ao longo de toda a trama, pontuando o imaginário, o temido e o desejado. O fato de se distanciar tanto da realidade atual da Grécia não significa, no entanto, que não dialogue com ela. A busca da beleza, do amor e da fé, não deixa de ser um caminho alternativo, idealizado, quando o mundo real parece tão duro de enfrentar.

Os filmes gregos de novos diretores mostram que está germinando um novo cinema por lá. Ninguém espere a sofisticação e a estética maravilhosa do mestre grego do cinema, Theo Angelopoulos (1936—2012), é claro. Mas nem é possível, mesmo, exigir tanto de jovens cineastas. Que o cinema grego atual mostra talento, não há dúvida. Isso é muito promissor.


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